Desde que ganhei irmãs, nunca mais flertei com a solidão

Melyssa K.
4 min readSep 6, 2024

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5 de Setembro é o dia dos irmãos, e eu sou louca pelas minhas

Because the greatest Love of all is happening to me

Algumas pessoas são boas em esportes, em falar em público, em desenhar, escrever, pintar, cantar, e uma infinidade de outras coisas. Eu, no entanto, sou a melhor em apenas uma: ser irmã. É meu papel, minha função social. Minha razão de ser. É claro, entre uma criança de 6 anos que responde às minhas mais apaixonadas declarações de amor com: “Mel, você já disse que me ama quarenta vezes só hoje, eu sei” — leia com tom de tédio, é o tom que ela usa — e uma adolescente de 16 anos cuja linguagem do amor definitivamente não é toque físico, e eu amo abraçá-la — , preciso reconhecer que a saudade diária da irmã mais velha que não vive sob o mesmo teto que elas, é muitas vezes inglória.

A K (16 anos), é um presente conquistado, daquelas pessoas que se você tem o amor, então você tem tudo. Você nunca mais vai se sentir sozinho (a) se ela decidir te amar. Eu tive sorte, e ela decidiu me amar, há anos atrás quando chegou na casa que logo se tornaria nossa e começamos a entender, ainda que bem devagar, a nova dimensão que a nossa relação estava adquirindo à partir daquele dia. Hoje temos clareza, hoje sei que sem ela por perto uma parte importante de mim se perde, já escrevi antes e acho válido repetir: “queria que você passasse um dia dentro do meu coração e entendesse que quando fico duas semanas longe de você algo dentro de mim vai esmorecendo, começo a me sentir desconectada do mundo, de mim, de Deus”. Quando ela me olha, sei que me lê com profundidade de quem conhece meu espírito e meus desvios mais sombrios. É centenas de vezes mais inteligente que eu, tudo que levo anos para processar, ela já compreendeu muito antes. É também uma das pessoas mais expressivas que já conheci, transborda por onde passa, por cartas, fotos — especialmente aquelas do pôr do sol que ela ama tirar — músicas, livros e toda sorte de expressão possível. Eu sonho acordada com o dia em que vou levá-la ao Rio de Janeiro pela primeira vez, quando faremos nossa primeira viagem internacional juntas, ou quando ela descobrir que ama acampar (porque eu sei que ela vai amar), também sonho com o dia em que vou me perder, e será a mão dela que me trará de volta. No mais, quando ela me olha, quando reivindica nossa noite de filmes, que de fato, é dela por direito, fico feliz apenas por existir e ser requisitada. De tantas possibilidades, ela me escolheu. E isso foi a coisa mais poderosa que já me aconteceu até hoje.

A (6 anos), me reconfigurou. Pegou cada partezinha do meu ser e reorganizou à sua forma, assim como faz milimetricamente com os próprios brinquedos. De certa forma, sinto que ela é a materialização daquela máxima de que tudo muda o tempo todo. Porque eu não sabia que estava pronta para tê-la, até ela me mostrar. Quando animada, ela pula no meu colo e me dá os meus adorados cinco beijinhos (um na testa, um em cada bochecha, um no nariz, e um no queixo), imediatamente minha cabeça-toca-disco começa a ressoar The Greatest Love Of All da Whitney, porque nesse momento sei que o maior amor de todos está acontecendo comigo. Mas além de amor, A também é brincadeira. Sendo criança, faz sentido. Ela me conduz de volta para casa, de volta àqueles tempos mais simples. E de alguma forma, é como se sempre tivesse estado aqui, ainda que tenha chegado depois de longos 17 anos de espera não consciente. Quando criança, eu observava as estrelas com uma amiga no quintal da casa da minha avó, hoje, quando retorno a essa lembrança, sinto que era A que estava lá. Sequer lembro o nome da amiga, tamanho delírio da minha imaginação: A nasceu para mim assim como nasci para ela. Estávamos nos esperando o tempo todo, eu sei que ela adoraria deitar no chão e observar as estrelas comigo. Porque ela já sabe, tão pequena, ela já sabe que os grandes acontecimentos da vida envolvem a presença genuína daqueles que amamos. Hoje, um pouco mais esperta, entendo que quando se recebe um amor assim, é preciso separar um tempo da rotina, se espreguiçar no sol e dizer: obrigada.

Fato é que desde que ganhei irmãs, nunca mais flertei com a solidão. Nunca mais me senti sozinha no mundo como se não houvesse algo maior, porque o meu grande amor, o grande acontecimento da minha vida, o meu algo maior, já aconteceu: vocês chegaram. E isso pra mim —o nosso amor — , é tudo.

(K, você me faça o favor de ler esse texto para A, grata desde já! Pode ser um momento antes daquele “Boa noite, te amo” que nunca esquecemos de dizer antes de dormir).

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